

Contentamento
Agora estou livre, disse a pipa. Arrebentou a linha que me prendia às
mãos de uma criança.
Que será dela, triste ao me perder? Ou vai continuar a vida, fazendo novas pipas...
Eu estou contente. Não sei onde chegar, mas vou curtir o caminho do vento. Quando chegar, se chegar, eu decido o que fazer.
Não é fácil decidir. Antes, preso na linha eu podia voar em círculos, subir, descer, mas sempre tinha onde chegar, ou seja, nas mãos do meu dono. Ele cuidava bem de mim. Mantinha as varetas bem vergadas, colava os pequenos rasgos, acertava a rabiola e o cabresto para eu poder subir mais, em suas mãos, lógico! Era uma vida tranquila, sem sobressaltos, mas também sem novidades. Era uma vida besta.
Agora estou livre. Não sei aonde o vento vai me levar, mas pouco importa. Receio não encontrar aquilo que sempre desejei; a felicidade.
Mas ser livre e não poder voar é complicado.
Por isso conto com meu amigo vento. Ele não para de soprar. Conversa comigo e conta o que acontece mundo afora. Ele pode me levar para bem longe, aí eu decido o que fazer da minha vida. Uma nova vida? Quem sabe!
Vai ser uma vida diferente; vou ser diferente. Não me acomodarei. Vou procurar novos caminhos e construir novos relacionamentos.
Caminhar é preciso.
O viver só se justifica quando estamos caminhando. Mas caminhando na direção que escolhemos ou que desejamos.
Para encontrar o contentamento é essencial caminhar pelo bom caminho.
Viver é preciso.
Livre.
Mas, e a criança que me prendia à linha, onde estará?
O tempo passou para ela? Cresceu? Já não empina mais pipas...?